Biografia de Madalena Perdigão


PERDIGÃO, Maria MADALENA Bagão da Silva Biscaia de Azeredo
Figueira da Foz, 28/04/1923 – Lisboa, 05/12/1989

Madalena Perdigão frequentou o Instituto de Música de Coimbra tendo concluído, no final do ano lectivo de 1936/1937, o 6º ano do curso geral de piano (um dos seus professores foi Fernando Lopes Graça). Em 1944 licencia-se em Matemática pela Faculdade de Ciências da Universidade de Coimbra, ingressando no ano lectivo de 1945-1946 no curso superior de piano. Em 1948 efectua o exame final do 3º ano do curso superior de piano após ter realizado estágio na classe do professor José Lúcio Mendes Júnior, professor da secção de música do Conservatório Nacional. Entre 1958 e 1974 é Directora do Serviço de Música da Fundação Calouste Gulbenkian, exercendo este cargo em regime de gratuitidade de funções. Vai ser responsável pela organização dos treze Festivais Gulbenkian de Música, realizados entre 1958 e 1970, que têm origem no festival de música organizado em 1957 a cuja comissão de honra pertenciam a marquesa do Cadaval, a D. Elisa de Sousa Pedroso e o maestro Pedro de Freitas Branco. No entanto, ao contrário deste primeiro festival de música, Madalena Perdigão vai ter como ambição a descentralização e o desenvolvimento da cultura musical em Portugal através da sua promoção em todos os extractos sociais da população e não só nas elites. Desta forma, após a realização do festival de 1958 no Coliseu dos Recreios, os Festivais Gulbenkian de Música vão ter como locais de acolhimento as cidades do Porto e de Coimbra, e ainda as regiões da Madeira e dos Açores, numa clara tentativa de descentralização das artes. Por iniciativa sua vão ser criados, na Fundação Calouste Gulbenkian, três agrupamentos artísticos residentes – Orquestra (1962), Coro (1964) e Ballet (1965) – que vão ser responsáveis por uma dinamização cultural efectuada por todo o país.

Após ter promovido na Fundação Calouste Gulbenkian, nos dias 21 e 22 de Abril de 1971, um colóquio sobre o projecto de reforma do ensino artístico, é nomeada, pelo ministro Veiga Simão, presidente da Comissão Orientadora da Reforma do ensino artístico, instituída no Conservatório Nacional logo após a colocação deste estabelecimento de ensino, no início do ano lectivo de 1971/1972, em regime de experiência pedagógica ao abrigo do Decreto-Lei nº 47587, de 10 de Março de 1967. Irá permanecer no exercício destas funções até 1974, altura em que abandona a Comissão, na sequência de várias críticas e dos próprios acontecimentos que tiveram lugar Conservatório Nacional. Nesta ocasião, abandona também o serviço de música da Fundação Calouste Gulbenkian, para onde só volta em 1984 para presidir à criação e dinamização do ACARTE (Serviço de Animação, Criação Artística e Educação pela Arte), serviço complementar do Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, indo permaner nestas funções até à data da sua morte. Entre as múltiplas actividades que desenvolveu ao longo da sua vida, registe-se ainda o facto de ter sido Directora do Gabinete Coordenador do Ensino Artístico no Ministério da Educação (1978-1984), assim como presidente da Associação Portuguesa de Educação Musical.

A acção de Madalena Perdigão, ao nível do ensino da artes em Portugal, assume especial relevância não só pelos projectos apresentados, mesmo que raramente concretizados (por exemplo, a proposta de criação de uma Academia de Música no seio da própria Fundação Calouste Gulbenkian), como pelo reflexo da acção desenvolvida ao nível da Comissão Orientadora da Reforma do ensino artístico, sendo responsável pela inclusão desta modalidade de ensino – nomeadamente ao nível da música, do teatro e da dança – nos esquemas gerais de ensino, generalizando desta forma uma experiência que estava em curso entre nós, desde 1968, na Academia de Música de Santa Cecília. É neste mesmo pressuposto, e de certa forma como continuação do PNEA (Plano Nacional de Educação Artística), apresentado em 1979, que a reforma do ensino artístico realizada pelo Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de Julho, irá apontar. Pode dizer-se que a sua acção, ao nível da educação artística, se pautou  fundamentalmente por uma atitude de carácter prático em que, dentro dos condicionalismos então existentes, tenta fazer chegar as artes do espectáculo a toda a população portuguesa, ao mesmo tempo que promove a excelência e a qualidade ao nível da formação artística existente em Portugal. De facto, a sua obra escrita de carácter pedagógico resume-se apenas a alguns artigos, entre os quais destacamos “Da educação artística: Perguntas e algumas respostas” (1979) e “Educação Artística” (1981).

Dentro da acção promovida por Madalena Perdigão na Fundação Calouste Gulbenkian, e no âmbito dos cursos promovidos entre 1959 e 1975, é de salientar o facto de ter sido responsável pela introdução, em Portugal, de diversas abordagens pedagógicas ao nível da educação e da iniciação musical, facto que irá constituir uma novidade entre nós e que irá motivar diversos tipos de resistências entre os sectores mais conservadores do ensino artístico, os quais afirmam que estas novas pedagogias (Dalcroze, Willems, Chapuis, Chevais, Orff, Ward, etc.) são por si só insuficientes como forma de preparação dos futuros profissionais da Música. Contudo, esta sua diferente atitude face à didáctica musical, e também à educação pela arte, vai ser responsável pela introdução de algumas novidades na formação até então ministrada no Conservatório Nacional. Neste sentido, Madalena Perdigão apoia a criação, em 1971, de um curso de formação de professores de educação pela arte, apesar da resposta bastante negativa face à proposta de criação de um curso de formação artístico-pedagógica para artistas e professores de arte, proposta que fora apresentada no âmbito desta mesma experiência pedagógica. A sua acção ao nível do ensino artístico pode ser resumida em duas grandes linhas de intervenção: por um lado, a integração do ensino artístico, que até então tinha sido ministrado em moldes especiais, nos esquemas gerais de ensino; e, por outro lado, a disseminação de diversas abordagens pedagógicas existentes ao nível da didáctica musical, promovendo uma formação efectiva de docentes capazes de recorrerem à sua aplicação.

Não existem ainda muitas referências bibliográficas sobre a biografada, sendo que grande parte destas se inserem dentro do âmbito de acção da Fundação Calouste Gulbenkian. Madalena Perdigão não deixou de ser uma pessoa polémica ao nível dos diversos projectos por si apresentados, o que é em parte patente nas clivagens ainda hoje existentes dentro do ensino artístico e as quais se repercutem na dicotomia criada em torno dos conceitos de “educação pela arte” e de “educação para a arte”, no momento da elaboração do Plano Nacional de Educação Artística. Mais recentemente estas dicotomias manifestam-se no debate em torno de uma formação de “profissionais” e de “amadores”, ou de uma formação de “artistas” e de “públicos”. De qualquer forma, para além de duas referências escritas por Carlos Pontes Leça em homenagem a Maria Madalena de Azeredo Perdigão e publicadas na revista Colóquio/Letras, em Dezembro de 1989, e na revista Colóquio/Artes, em Março de 1990, é de realçar o facto de ter sido criado, já nos anos noventa, o Prémio ACARTE/Maria Madalena de Azeredo Perdigão destinado a distinguir o espírito de inovação no campo das artes do espectáculo. O seu nome fica ligado ao esforço de renovação do ensino artístico, nos anos setenta e oitenta, como bem revelam os testemunhos publicados em 1993, por iniciativa da Comissão Executiva do Festival Internacional de Música. Regista-se apenas o testemunho de João Bénard da Costa: “Dela, nunca conheci senão vida, vida até ao fim e vida até ao cabo. E tudo o que recebi dela, foi vida sempre. Quando penso nela, penso nesse olhar de vida, penso no que soube dar e penso no que soube receber. […] Os sinais do novo foi ela quem mos mostrou. Só um olhar muito novo pode fazer nascer de novo” (1993, p. 14).

Bibliografia principal
“Da educação artística: Perguntas e algumas respostas”, Raiz e Utopia, nº 910, 1979, pp. 232234. “Educação Artística”, in Manuela Silva & M.ª Isabel Tamen (coord.), Sistema de ensino em Portugal, Lisboa, 1981, pp. 285305.
Colaboração em Revistas de Educação
Trabalhos sobre o Autor
Fundação Calouste Gulbenkian, Relatório do presidente, Lisboa, 1961. Carlos de Pontes Leça, “Madalena de Azeredo Perdigão: Uma presença no mundo das letras”, Colóquio/Letras, nº 112, 1989, pp. 56. Carlos de Pontes Leça, “Homenagem a Madalena de Azeredo Perdigão e João de Freitas Branco”, Colóquio/Artes, nº 84, 1989, pp. 56-59. Alice Vieira, “Em Perfil: Madalena Perdigão”, Diário de Notícias, 7 de Janeiro de 1989. Comissão Executiva do Festival Internacional de Música, Madalena de Azeredo Perdigão, Lisboa, 1993. Maria João Martins, Mulheres Portuguesas, Lisboa, 1994, vol. II, pp. 138-139. Fundação Calouste Gulbenkian, Dossier de imprensa – Prémio Maria Madalena de Azeredo Perdigão: Temporada 1994/1995, Lisboa, 1995.

Carlos Alberto Gomes